13 de novembro de 2012

O INJUSTO "JOGO" DA VIDA




A vida não é um jogo, senhoras e senhores. De jogos eu conheço bem: perdi incontáveis horas da minha infanto-adolescência neles, continuo perdendo na fase adulta e certamente perderei na minha velhice. Nos jogos quase tudo é negociado: a dificuldade, os louros da vitória, os prejuízos da derrota, o número de chances e tentativas, o tempo a se permanecer jogando, a hora de parar, as consequências de cada escolha dentro do jogo. Nada disso se parece com a vida. Pra começar, nem é você quem dá o “start” inicial da vida e dificilmente será você a determinar o “game over”. As instruções que lhe são passadas sobre o “como viver” nem sempre são corretas ou fidedignas e quase sempre você aprende a essência da coisa perdendo e errando mesmo, sem direito a uma segunda chance. Se um fracasso homérico acontece na sua vida, não dá pra simplesmente voltar ao ponto onde o erro começou; e mesmo que digam que “nunca é tarde pra recomeçar”, experimente dizer isso a um ex-presidiário que acabou de sair da cadeia após 15 anos de prisão, por exemplo. A vida não é um jogo e, portanto, não deve ser tratada como um.

Há algum motivo específico para essa introdução, Alysson? Sim. Na semana em que milhões de brasileiros fizeram a prova do ENEM, pergunto-me quantos desses jovens são capazes de fazer uma real avaliação da carreira que eles pretendem seguir. Eu mesmo assumo: quando fiz o ENEM, passei no infame PROUNI e entrei na faculdade, confesso que não tinha a menor idéia do que fazia um fisioterapeuta, como atuava, qual a sua média salarial, qual a carga horária média, o que teria de pior e melhor pra lidar no cotidiano profissional, entre outros. Eu tinha 17 anos, um péssimo corte de cabelo, um terrível gosto pra me vestir, comer, ouvir e ver o que o mundo me proporcionava. Eu mal sabia o que queria comer no almoço do dia seguinte, como poderia ter escolhido bem a minha futura carreira? É normal esperar de um indivíduo de 17 anos o discernimento pra escolher a carreira que vai prover o seu sustento pelo resto da sua vida? Não!

Por sorte, eu abracei a Fisioterapia e ela me abraçou. Talvez por pura sorte, hoje eu esteja vivendo relativamente bem a minha profissão. Ou talvez não: foram necessários dois anos de desemprego após a formatura, frustração e pressão familiar até que eu encarei (e me esforcei pra alcançar) a única saída que me daria um emprego sem que eu dependesse da boa vontade/caridade de ninguém, ou seja, passar em um concurso. Hoje, devidamente concursado, trabalhando satisfatoriamente e regularmente no meu emprego, vejo que alguns problemas antigos desapareceram e deram lugar a novos problemas. Mas não me sai da cabeça essa sensação de estar sendo carregado pela vida, sendo levado aos rumos que ela aleatoriamente decide. E aquele papo de que eu deveria decidir, se não os caminhos, pelo menos os destinos em que eu gostaria de chegar?

Que fique claro: neste post eu não critico a minha profissão especificamente (o que eu penso a respeito da Fisioterapia foi claramente exposto neste post) e nem nenhuma outra profissão. A crítica é a um padrão típico solidificado na sociedade, onde jovens são metralhados com conhecimentos sem aplicação prática (na escola), pressionados a escolher um rumo profissional numa faixa etária onde é impossível avaliar as consequências dessa escolha (na adolescência) e, em seguida, torturados num processo seletivo excludente e altamente falho (atualmente o ENEM, ou vestibulares de faculdades particulares). Os que sobreviverem vão aprender na faculdade/universidade a seguir uma carreira, seja ela prática ou acadêmica, muitas vezes sem ter a menor idéia do que isso significa, se ela é adequada aos seus anseios e necessidades. Afinal, no Brasil, parece estar claro que médicos, promotores e auditores fiscais (por exemplo) terão maior rendimento financeiro; mas também é notoriamente reconhecido que tais cargos não são adequados ou acessíveis pra qualquer pessoa e nem só de salário se vive uma vida profissional satisfeita e feliz. Aqueles que perceberem tarde demais que sua escolha profissional não foi feliz podem até tentar recomeçar, claro, mas existe uma série de fatores que podem dificultar ou até impedir o recomeço... isso quando não já é literalmente tarde demais.

Refletir sobre esses pontos me deixou com um amargo gosto de insatisfação na garganta. Apesar de nada estar exatamente ruim na minha vida profissional, tenho convicção de que estou longe do patamar desejado, onde eu poderei dizer sem medo: "estou satisfeito". Tenho a impressão metafórica de que eu venho sendo um boneco de isopor flutuando no mar da vida, sendo levado pra onde as ondas querem, sem ter a chance de decidir pra onde eu gostaria de ir, e tem sido assim faz muito tempo. Talvez seja a hora de começar a andar por minhas próprias pernas, afinal, com 25 anos eu tenho bem mais preparo e bagagem pra decidir os rumos do meu futuro do que há 8 anos atrás...

16 de agosto de 2012

SOBRE TER E SER PAI


Fiz questão de passar o dia dos pais com o meu pai neste ano. Não exatamente por ser um ano mais especial ou porque ele mereça mais que nos anos passados, pois se existe uma diferença nessa atitude - e sim, existe uma diferença - ela é produto de uma longa auto-reflexão que tive poucos dias antes dessa data comercial. E há exatos dois posts, deixei bem claro a complexa e difícil relação que tenho com o meu pai, que é o resultado direto da vida familiar (ou ausência dela) que ele me proporcionou e da diametralmente oposta visão de mundo que nós dois temos.

Alguns dias antes do dia dos pais, eu me peguei pensando no quão boa tem sido a relação entre eu e ele, o meu pai. Não que ela seja sequer próxima daquela vida familiar ideal que as propagandas de margarina e as caixas de suco artificial ostentam, mas, ainda assim, está consideravelmente melhor do que foi ao longo dos meus primeiros 20 anos de vida. Ele não se mete muito na minha vida, eu retribuo e agradeço por esse comportamento. Ele não atrapalha e não se opõe quando o que eu faço o desagrada, mesmo que não também não me ajude, apoie ou participe disso. Ele não me dá despesas físicas, financeiras e emocionais e eu, mais uma vez, retribuo da mesma forma. Resta apenas uma convivência educada, de cumprimentos, de cooperação suave e bastante superficial, com algumas raras exceções. Sinceramente? Está muito bom do jeito que tá!

Talvez seja porque eu não seja mais criança/adolescente, eu hoje enxergo um lado sobre a paternidade que antes eu era incapaz de ver: meu pai não é obrigado a cumprir as expectativas que eu criei em cima dele e, além disso, ele não é culpado por tudo que me aconteceu de ruim na vida. É razoável que eu tenha que aceitá-lo por ser como é, da mesma forma que eu exijo que ele faça o mesmo por mim, sem mais perguntas ou interferências. Também não é justo que eu o julgue tão rispidamente pela sua ausência, principalmente porque eu tive uma mãe bastante interessada, disposta e capaz de ocupar os espaços vagos que meu pai deixou. Eu deveria, no mínimo, agradecer pelo fato de que ele não é e nunca foi uma pessoa diretamente ruim pra mim, embora tenha feito seus estragos indiretos... mas quem nunca?

E saindo um pouco mais do ponto de vista de TER um pai e passando para o de SER um pai, pergunto-me: estaria eu preparado pra essa tarefa? Porque, ao menos potencialmente, não há nada que me impeça de ser pai; embora tal pretensão não faça parte dos meus planos de curto, médio e longo prazo, pelo menos por enquanto. Eu só tenho a certeza de que ser pai é bem mais do que disseminar irresponsavelmente os próprios genes pelo mundo ou brincar de formar pessoinhas com personalidades, atitudes e escolhas numa forminha que satisfaça o seu prazer de progenitor.

Acredito que ser pai/mãe de verdade (sim, porque existem vários monstros brincando de ser pai e mãe por esse mundo) é evoluir o próprio sentido de viver, é entrar num nível novo de existência. Biologicamente, somos programados exclusivamente para cumprir uma tarefa: sobreviver, o tempo máximo possível e da melhor forma possível. A sobrevivência inclui duas modalidades: sobreviver individualmente (fisiologia pura: respirar, comer, beber, dormir, excretar, etc) e sobreviver como espécie (basicamente: procriar). Ter um filho é entender que sua sobrevivência individual é secundária perante a sobrevivência individual da sua progênie; é deixar de ser a coisa mais importante do mundo para colocar os seus filhos neste patamar de importância. E, sinceramente, acredito que poucas pessoas estão preparadas e dispostas a cumprir esse papel.

Pelo fato de eu ser um egoísta convicto e assumido, certamente não estou preparado e muito menos disposto a ter filhos. Meu nível de maturidade e inteligência emocional consegue reconhecer que no mundo existem pessoas de importância no máximo equivalente à minha (família mais próxima e amigos), mas ainda não quer ou pretende perder o posto de "Sol" para outra criatura, seja ela quem for. Apesar disso, estou bastante confortável com esta forma de levar a vida, sem previsão pra mudanças.

Consciente disso, como posso eu exigir do meu pai que ele faça por mim algo que eu nem sou capaz de fazer por um possível filho? E mais: como posso julgá-lo e afirmar que não fez/faz isso por mim? Sem parâmetros e sem o poder de ler e entender a mente do meu pai, com que direito eu posso condená-lo de ser um mau pai? Num futuro distante, onde eu já seja pai, serei eu um pai melhor do que o meu foi?

Eu não pude responder essas perguntas, nenhuma delas. Portanto, continuo pensando nisso e tentando ser um filho mais razoável. Afinal, a gente nunca sabe o que nos espera quando a vida te obriga a ser na primeira pessoa aquilo que você só conhecia em terceira pessoa.


"Você sempre me ensinou
a diferença do certo e do errado
Eu preciso de sua ajuda,
papai, por favor seja forte
Eu posso ser jovem no coração
Mas eu sei o que estou dizendo"

(Papa don't preach - Madonna)

24 de junho de 2012

"SEM-VERGONHICE" VS HIPOCRISIA



Hoje estava passando uma reportagem no Fantástico sobre manifestações contra a exposição, violência e o turismo sexual de mulheres na Ucrânia, seguido de manifestações da Marcha das Mulheres e da Marcha das Vadias; parei pra ver apenas porque se tratava dos movimentos feministas (leia antissexistas) que aproveitaram o período do Rio+20 para obter maior visibilidade. Nesse momento, uma tia criticou severamente a nudez como forma de arma política, dizendo ser  só uma "sem-vergonhice" e "coisa de gente que não tem o que fazer".

Fico pensativo quando acontece esse tipo de coisa. Na própria Globo, na nova versão da novela Gabriela, é abordada uma série de formas de expressão (ou falta dela) e caracterização do papel (sempre inferior) da mulher na sociedade daquele tempo, além do constante uso de rótulos: "puta", "beata", "senhora de família", "sinhazinha", "retirante", "vagabunda". E não sem críticas, a cada cena onde um homem deseja "usar" sua esposa como mero objeto do sexo, ou nas cenas onde um sujeito casado deixa sua esposa em casa e vai divertir-se no bordel da cidade com prostitutas; em cada cena dessas, a mesma tia supracitada declarava verbalmente o desprezo por tal comportamento social da época e o alívio por viver em tempos bem diferentes...

Mas seria mesmo este tempo tão diferente? É fato que os movimentos anti-sexismo e anti-homofobia (uma derivada da misoginia e do machismo, tanto para gays quanto para lésbicas) mudaram drasticamente o comportamento social, mas não o suficiente pra todo mundo sentar no sofá, ver esse tipo de reportagem e achar que "isso já é ir longe demais". Mulheres ainda são estupradas; esposas ainda apanham dos maridos; o salário das mulheres ainda é 75% menor que o dos homens, mesmo quando ocupam os mesmos cargos; juízas, políticas e advogadas de sucesso ainda sofrem mais ameaças que homens nos mesmos papéis; garotas ainda são objeto de comércio no tráfico e turismo sexual; tudo isso acontece DIARIAMENTE. Mas tudo isso parece pouco, ruim mesmo é ir pras ruas brigar contra tudo isso de peito de fora. Violência é aceitável, enquanto "vulgaridade" não, é isso mesmo, Brasil?

Acho impressionante a forma como o machismo consegue ser tão enraizado na sociedade a ponto de os próprios prejudicados por esse legado usarem o discurso preconceituoso contra sua própria liberdade e direito à igualdade. É o mesmo contexto que faz uma mulher mais conservadora se colocar no direito de julgar outra mulher de "vadia" e "vagabunda" apenas porque ela quis usar algo mais confortável e exposto; o mesmo contexto que um homossexual mais discreto ou mesmo ativo usa pra se colocar no direito de julgar e difamar outros gays mais afeminados ou passivos; é o mesmo contexto onde uma mulher casada e recém-mãe abdica do próprio emprego e assume o papel de mãe-em-tempo-integral enquanto o marido continua na rotina confortável de chefe da família.

E apesar de tudo isso, a única atitude que eu consegui realizar foi ficar paralisado e bestificado ao ver mais uma mulher-machista e tão próximo do meu núcleo de convivência. Eu poderia tentar discutir e até educá-la sobre o contexto onde tirar a camisa e mostrar os seios é bem melhor do que ficar vendo TV e criticando sobre o comportamento alheio, mas... sinceramente? As vezes esse meu lado politizado dá lugar ao do Alysson nojentinho, que acredita que se o mundo tá nessa merda, é porque bem mais de 50% da população merece esse mundo. Porque aqui se faz e aqui mesmo se paga.

"No canto com seus amigos, você apostou 5 dólares
Que ganharia garota que acabou de entrar,
Mas ela te acha um idiota
Nós não nos produzimos só pra você ver
Então, pare de derramar sua bebida em mim

Você sabe quem você é
Se achando, falando merda,
Mas você vai voltar sozinho para casa, não é?"


(P!nk - U + UR hand)


9 de junho de 2012

TA-TU-A-GEM



"É provável que o senhor nunca venha a ler esta carta, papai, mas...

Foi só há alguns anos atrás, eu estava no complexo dilema de sair do armário. O senhor nunca vai saber muita coisa sobre todo “boom” que houve naquela época, mas é importante mencionar: aceitar a minha orientação sexual não foi o meu único problema naqueles dias. Havia todo um emaranhado de sentimentos de ódio, preconceito, auto-flagelação mental, vergonha e depressão, mas nada superava o medo de decepcionar quem eu amava, ou seja, o senhor, mamãe, meu irmão e meus amigos.

De todos os ressentimentos que eu mantinha naquela época, restou apenas um, que talvez nunca seja extinto totalmente: a insensibilidade das pessoas que eu amava, inclusive do senhor. Vocês não precisavam saber pelo que eu estava passando, ou o motivo da minha tormenta; bastava que vocês simplesmente percebessem que algo estava errado, que algo estava acontecendo comigo. E devido a todo o meu quadro social, de isolamento, de inversão dos ciclos de sono, de redução na comunicação, de ausência generalizada, vocês poderiam facilmente levar a sério e perceber que havia algo errado e ruim se passando comigo.

O bonito de tudo isso é que passou. Faz tão pouco tempo, mas eu enxergo como algo tão distante da minha realidade e tão antigo. Depois que eu comecei a me aceitar e me entender como gay, várias outras questões incompletas em mim foram resolvidas de forma tão rápida e fácil que eu me pergunto o quanto a homossexualidade me fez uma pessoa melhor. De lá pra cá, eu fortaleci amizades, abandonei pessoas com boas razões, experimentei relacionamentos, experimentei também a solidão, entrei em contato com meus demônios internos, desmistifiquei o sexo, adquiri independência financeira, morei em uma nova cidade, atualmente moro na mesma casa que o senhor, mudei de religião, conheci outros países e fiz minha primeira tatuagem.

Ta-tu-a-gem. É só um desenho com tinta sob a pele. Quem estava comigo no dia da primeira sessão viu, a cada minuto de dor da perfuração, a minha felicidade e satisfação da realização de um sonho, o meu sonho. O senhor precisava ter visto o apoio que seu outro filho – meu irmão – me deu: foi um dos momentos de maior carinho, cuidado, proteção e cumplicidade entre eu e meu mano. E no dia seguinte, o cuidado e apoio da minha mãe e do meu primo, comprando os materiais pro curativo e também fazendo o curativo 3 vezes por dia. Era tanto apoio e felicidade dos meus familiares e amigos... até ter a experiência de voltar a conviver com o senhor.

Onde eu enxergava felicidade, satisfação e realização, o senhor enxergava apenas nojo, decepção, desprezo. Não foi preciso que o senhor visse a tatuagem inteira para sequer olhar nos meus olhos e balançar a cabeça em tom de reprovação sempre que eu passava; um ato compartilhado pelas suas irmãs. E todo esse desprezo velado, sem uma única palavra dita, sem uma única demonstração de afeto, nem nenhuma naturalidade do tratamento cotidiano não passaram despercebidos por mim. E mais uma vez, apesar de não gostar e não saber os motivos que me levaram a fazer a tatuagem, o senhor novamente não viu que algo se passava comigo... porque eu entendo que eu fiz uma escolha e ela tem consequências, mas independente de tudo isso, era muito fácil o senhor perceber que minhas costas estavam machucadas, feridas, doendo, sangrando; e eu precisava de ajuda para cuidar dessas feridas intencionais, sob pena de adquirir uma infecção.

Por conta da sua notória, antiga e contínua negligência como pai, eu fui forçado a acordar minha grande amiga-e-irmã às 6 da manhã por vários dias, apenas para que ela cuidasse de mim, apenas para que ela cumprisse o papel que poderia/deveria ser seu. E requisitá-la todos esses dias, tarde da noite, pra que o curativo fosse refeito antes de eu dormir. Como foi bom saber que eu posso contar com ela pra isso, como foi bom reforçar esses laços, mesmo que nunca tenham se enfraquecido. Como foi importante saber que, mais uma vez, eu não posso contar com o senhor. Como foi bom o senhor ter se ausentado e isso ter me deixado plenamente à vontade para excluí-lo totalmente, sem que eu precisasse pedir ajuda por nem mesmo uma única vez.

Acredite papai – e isto não é uma praga, é apenas a constatação do provável desenrolar dos fatos: eu não vou morar pra sempre com o senhor. Eu ainda pretendo estudar mais, me preparar e me capacitar, ter um emprego melhor, talvez ser dono do meu próprio negócio, morar numa cidade maior, ter um salário maior... são tantos objetivos de uma vida que ainda está na etapa ascendente da primeira fase da juventude-adulta. E o senhor, papai? O senhor caminha para a velhice, pra solidão, pra etapa descendente da vida. E, infelizmente, eu não consigo me enxergar suprimindo ou anulando NENHUMA das minhas conquistas futuras para dar o suporte que o senhor possa vir a precisar. Não por ressentimento ou vingança, papai, eu só não quero ter que dividir a minha felicidade de homem independente, bem sucedido, gay e multi-tatuado; já que é evidente que pelo menos duas dessas condições vão te incomodar pro resto da vida e, consequentemente, te trazer infelicidade."

Pra assistir/ouvir (e ler a tradução) depois da postagem:

17 de março de 2012

PACIÊNCIA


Eu fui riscando um após outro da lista, e foram muitos. Com os erros passados, a gente tem uma noção média de quem quer e quem definitivamente não quer por perto. É bem verdade que existe um lado cruel nisso, afinal, dizem que é feio jugar as pessoas por quem conhecemos no passado, não é mesmo? O fato é que existem incompatibilidades (algumas absurdamente óbvias) e critérios esquisitos e completamente inexplicáveis que criamos... e que seguimos, sendo cruéis ou não.

Restaram poucos entre os "aptos", ou potencialmente aptos, pelo menos. Infelizmente, eles estão ocupados, ou desinteressados, ou moram longe, ou estão comprometidos, ou são heterossexuais, ou são tímidos, ou uma série de outras explicações para definí-los como "indisponíveis". Eu tentei muitas, várias vezes e cansei. Vejam só, aos 24 anos (quase 25) e já estou cansado de tentar: faz bastante tempo que eu decidi que o próximo homem para quem eu entregaria aquelas 3 poderosas palavrinhas deveria ser cuidadosamente escolhido sem as variáveis que impedem uma boa seleção; carência, pressão social e opinião alheia, entre as principais delas.

De longe, parece que eu estou em busca da perfeição, um novo modelo ou uma nova justificativa pra me agarrar ao sonho do "príncipe encantado do cavalo branco". Tolice. De perto, os que me conhecem sabem que eu busco exatamente o oposto: defeitos. A parte fácil disso é que pra minha religião (considerada maluca por muitos) sequer acredita que os deuses são perfeitos, quanto mais os homens. Eu busco algo meio raro: defeitos em equilíbrio, defeitos que eu consiga engolir, mesmo que a seco.

Faz realmente muito tempo que eu enxerguei verdadeiramente o fato de estar junto de alguém como uma possibilidade, não uma certeza, menos ainda uma necessidade. Isso não mudou nem um pouco dentro de mim, mas não é todo dia que estamos fortes o suficiente pra sustentar o peso das nossas decisões e a perseguição das consequências destas. Hoje é só mais um dos vários desses dias em que a noite chega, o sono demora a vir e o pensamento acaba voando pra zonas obscuras e intocadas durante o dia-a-dia, pra cutucar nossas fraquezas e despertá-las. E ainda virão outros, com certeza. Nesses dias, é oportuno lembrar que foi fácil riscar a grande massa de pretedentes da lista; ser "riscado" por quem você selecionou é que acaba sendo difícil. Dói, fere o ego, desequilibra seu senso de "convicções".

Nesses dias obscuros, fica compreensível algumas formas de "suicídio moral" que eu cometo: beber demais (pra ficar mal mesmo), fumar, buscar sexo gratuito, comer e dormir em horários totalmente irregulares. Parece que causar a si mesmo dor física e emocional a resaca moral maior do que a dor da solidão ajuda a desviar a atenção desse "problema maior". Perfeitamente aceitável, totalmente ineficiente.

E no fim deste chato desabafo às 4:00 AM da madrugada, fica a semi-decisão de ignorar a lista, os riscados e os indisponíveis. Chega de perder tempo criando modelos de "Concurso seleção para ocupar a vaga no coração do Alysson" e critérios pra toda essa porra. As resoluções dos meus problemas emocionais nunca foram fáceis na minha vida mesmo, tá passando da hora de eu me acostumar.

OBS: abaixo a canção que eu uso pra ninar a mim mesmo. Uma espécie de "ei, você: gostaria de cantar esta música pra mim?".