26 de junho de 2010

A PARADA GAY


Meu namorado me convidou para ir amanhã à Parada Gay. Ponto. Ele provavelmente ficará chateado pelo fato de que eu não ter aceitado o convite para acompanhá-lo na primeira vez que ele vai à Parada, uma coisa absolutamente comum entre namorados gays. Ponto. Mas a questão é que eu não aceitei o convite por motivos que nada tem a ver com falta de vontade ou disponibilidade de tempo. Também não é por pirraça, implicância ou nada que indique qualquer problema entre nós. Os motivos não são frágeis nem extrínsecos, pelo contrário, são extremamente pessoais e basais: eu não concordo com o movimento político atualmente apresentado pelas Paradas Gays da maior parte do Brasil e do mundo.

Diferente das gerações mais novas, a minha geração (e várias passadas, como disse a Dama em um coment do post passado) sofreu muito pra sair dos seus respectivos armários particulares (e não só do armário da sexualidade). Sexo, sexualidade e afins estavam embalsamados em tabus muito rígidos que, se por um lado eram sérios até demais, pelo menos não eram banalizados e esculhambados como são hoje. Foram períodos que, com certeza, estavam repletos de sofrimento, de violência, de estereótipos, de estigmas. E eu admiro muito quem lutou por uma posição por nós, que compomos toda a “classe” GLBT. Admito que nasci em uma geração onde a maior parte das trevas tórridas do “homossexualismo” já havia passado, ou seja, sou uma geração de transição. E talvez seja exatamente por isso que eu tenha tanto respeito e orgulho da militância que existiu e ainda persiste, apesar de não participar ativamente do movimento, mas sim como um colaborador que parte do micro para o macro (ou seja, o pouco de todos constitui o muito.

É exatamente a contra-mão das novas gerações que me preocupa. Mesmo correndo o risco de parecer ser um velho-gagá, conservador, tirano e com medo das mudanças, me assusta a banalização com que o tema GLBT tem sido tratado pelos jovens. Se por um lado eu admiro a naturalidade com que os jovens se assumem (intimamente e publicamente), cada vez mais cedo e sem retaliações tão violentas e tristes como eram antes (ou pelo menos bem menos freqüente do que antes); por outro lado, me revolta o desapego, a imaturidade e a irresponsabilidade que eles tem para com as principais decisões sociais e políticas que dizem respeito a todo(a) gay, lésbica, bi e etc. A Parada Gay é só um mero reflexo disso. Ali impera a corrente de pensamento atual: vamos nos divertir, vamos mostrar para o mundo o que fazemos e do que somos capazes, vamos incomodar a visão dos heteros nem que seja por um mero dia, vamos escandalizar, vamos ficar semi-nus, vamos nos vestir com trajes coloridos, purpurinados e caricaturados. Não fica claro que assim só aumenta o abismo e se reforça o pensamento de que os atuais estereótipos sobre os GLBT são verdadeiros?

Eu não sou hipócrita e me orgulho disso. Eu me divirto, eu beijo em público, não tenho vergonha de andar de mãos dadas com um garoto na rua e ainda pretendo ter uma camiseta totalmente pintada com as 7 cores do arco-iris. A diferença é que eu faço disso uma constante, do meu dia-a-dia. Não existe a menor necessidade de reforçar a minha sexualidade para os heterossexuais ou transformá-la em algo totalmente alienígena e que deve ser engolido pelas massas a seco, cedo ou tarde. Características como “apreciar a diversão”, “indiscrição”, “atrevimento”, “voyeurismo”, “promiscuidade” e etc NÃO SÃO exclusivas do grupo GLBT. Nunca foram e nunca serão, e é exatamente por isso que eu não concordo que expor tais atitudes numa avenida superlotada, seguindo trio-elétricos repletos de gogo boys semi-nus e drag-queens exuberantes, ao som de “I Will survive” e outra grandes músicas do repertório pop e eletrônico de divas seja a melhor forma de romper as barreiras do preconceito.

E não se engane: eu adoro gogo boys semi-nus (ou peladões mesmo), adoro festas (embora odeie superlotação), acho as drag-queens bem feitas e montada LINDAS, um espetáculo a parte (apesar de não ter vontade e nem coragem de imitá-las), adoro a maior parte das músicas que lá tocarão (como Lady GaGa e Madonna) e também adoro o clima de pegação e sensualidade que existe na maioria das Paradas Gays. E de forma homóloga, um homem heterossexual típico adora mulheres gostosonas semi-nuas (ou peladas mesmo), podem gostar de festas, podem gostar de fetichismo, podem gostar de seus respectivos estilos musicais e, mesmo que neguem, em sua maioria adoram sexo e sensualidade.

Se essas pessoas não selecionam um dia pra expor a vasta seleção de características do típico homem heterossexual brasileiro com orgulho e imposição, porque EU deveria apoiar um movimento que faz isso de forma similar e muitas vezes debochada, apenas porque a sexualidade do movimento mudou? Não é totalmente contraditório pedir direitos iguais e exigir um dia especial para nós membros do grupo GLBT, onde tudo o que pertença a “nossa cultura” seja exaltado e forçadamente exposto? E pra finalizar: será que é honesto dizer que ali estão representadas todas as “subcategorias” da comunidade GLBT? Mesmo sabendo que somos humanos como qualquer outro e, por sermos humanos, somos particulares, únicos, diferentes em muitas coisas e semelhantes exatamente apenas por sermos TODOS diferentes?

Acho que antes de fingirmos que o mundo é cor-de-rosa, é bom lembrar que ele foi vermelho escarlate, manchado do sangue que já foi derramado em lutas políticas para garantir o pouco que temos hoje. E mesmo se você não for um militante politicamente ativo, tenha o mínimo respeito por quem garantiu nosso presente e faça o possível, atitudes pequenas, que possam garantir que o futuro das pessoas que você ama seja um pouco melhor.

Eu simplesmente não me importo que meu namorado, meus amigos e pessoas queridas e conhecidas vão à Parada Gay, não me envergonho delas por irem, não os critico ou os julgo por terem decisões e atitudes diametralmente opostas à minha neste aspecto. Eu só peço que não me obriguem a ir e, que da mesma forma, não julguem a minha opinião e a minha atitude: elas estão fortemente embasadas e, até que eu receba uma contra-argumentação que me convença, elas não mudarão. E ponto final.

6 comentários:

Cris Medeiros disse...

Você tem razão no que diz... Mas pense que se hoje em dia a coisa está mais solta, mais festa, mais divertimento, é porque um dia pessoas lutaram muito para que esse espaço fosse criado... Em 1950, uma parada como a de Sampa seria impossível acontecer de forma tão relaxada... Apenas a forma de reinvindicar vai se ajustando...

Muita gente tá perdida? Está, mas estamos numa fase de transição, não só os homossexuais, mas as mulheres se sentem assim tb... Umas radicalizam e querem agir como homens, outras querem voltar a época de amélia... Toda fase de transição trás muita confusão junta...

Beijocas

Αιακοσ Επυαλιοσ disse...

Companheiro! Faz tempo que não nos falamos. Tanto você como eu andamos sumidos. São coisas da vida.
Mais uma vez tenho o prazer de vir aqui e ler seu ponto de vista autêntico e o seu discurso austero. Eu realmente achei pertinente a sua crítica e confesso não ter atentado antes para esse lado da questão. É realmente uma concepção muito sensata.

Abraços!

Paulo Roberto Figueiredo Braccini - Bratz disse...

Que bom poder voltar aqui ... meu pc deu tilt e eu perdi alguns links ... mas a sua ida lá no meu me proporcionou relinkar seu blog ...

Adorei o coment por lá ... kkkk ... ela realmente pode me prometer muitos daquilo ... adoooro ... mas meu votinho? na ni não!!!

Bjux queridão ...

;-)

Autor disse...

Uau, bela explanação e concordo em muita coisa com vc.
Mas, mesmo que não concordasse, respeito seu ponto de vista.

E, que saudade de vc, pessoa!
Muitas!

Zach disse...

Conseguio colocar no papel tudo o que sempre esteve presente na minha cabeça. Parabéns.

Anônimo disse...

hi, new to the site, thanks.